Por Leonardo Della Pasqua – Psicólogo e Psicanalista

Adolescências: família, identidade e limites

Filhos adolescentes sentem intensamente a ruptura dos vínculos conjugais de seus pais e muitos deles ficam perdidos e desestruturados depois da separação. Mesmo os pais ainda casados enfrentam desafios importantes em relação ao modo de se comunicar, a possibilidade de diálogo, a forma como exercem a autoridade e o jeito como lidam com a dependência e a rebeldia de seus filhos adolescentes. A função parental precisa de apoio e estímulo para as transformações que precisam realizar. A hierarquia e a autoridade dos pais precisa ser repensada e eles precisam de ajuda para atuarem como ponto de referência e limite para o mundo pulsional adolescente.

Contextualizando a família contemporânea

Com a migração para os grandes centros urbanos, temos uma nova realidade, pois encontramos a família nuclear constituída por um casal (ou somente a mãe) e um ou dois filhos, vivendo distante dos parentes. Desamparo e isolamento são consequências naturais deste fenômeno, pois as dimensões do que se entende por família se modificaram e os laços co-sanguíneos perderam força.

Toda esta reorganização social e familiar tem suas repercussões. A latência,  período fundamental para o desenvolvimento infantil, encontra-se abreviada frente a tantas transformações sociais. A adolescência, além de terminar mais tarde, começou a ter um início cada vez mais precoce. Por volta dos sete anos de idade há um período de inibições sexuais, onde aparece o asco, a vergonha, a compaixão, as exigências dos ideais estéticos, morais e da autoridade. É o período do desvio do uso diretamente sexual da libido, em que esta energia é voltada para outros fins.

Neste contexto, a vulnerabilidade da criança e do adolescente apresenta consequências de forte impacto para a sociedade. Alguns psicanalistas são categóricos ao afirmar que vivemos tempos de um verdadeiro abuso social, em função do tipo de produção subjetiva atual. Quando há rompimentos prematuros da latência, ou até mesmo a supressão dela, há consequências cognitivas, emocionais e comportamentais, por vezes irreparáveis.

 

A adolescência

Milhões de brasileiros nasceram em 2000, provindos das mais diversas realidades sociais e uma parcela considerável dessa amostra prefere o contato digital ao pessoal. A tecnologia facilita inúmeras situações na vida desses jovens, mas provoca muita dispersão, podendo afetar a atenção e a capacidade de focar em um assunto só.

O mundo dos adultos é muito desejado, mas também bastante temido, pois amadurecer significa a perda definitiva da condição que caracteriza a infância. Com a maturidade, aprenderão a aceitar em ser independentes dentro de um limite de necessária dependência.

O adolescente se apresenta como vários personagens, com flutuações de identidade passíveis de nos dar versões contraditórias sobre a sua postura. Existe a tendência ao afastamento da mãe, do pai e da família – com maior liberdade de pensamento e ação – e a necessidade de conservar ou retornar ao relacionamento com os pais.

Para facilitar a integração à vida adulta, certas sociedades desenvolvem rituais de passagem. Mesmo quando esses rituais são seguidos por sofrimentos físicos ou psíquicos, os jovens demonstram interesse em se submeter a eles, pois os mesmos representam aptidão, dignidade, consideração e aceitação por parte dos adultos, favorecendo o desenvolvimento de sentimentos de segurança, auto-estima e de confiança.

 

Função Parental

Crescer leva tempo e a passagem dos anos pode parecer uma eternidade. Enquanto o crescimento está em ato, a responsabilidade deve ser assumida pelas figuras parentais. Quando eles abdicam de sua função, os adolescentes passam a ter de encarar uma falsa maturidade e perdem algumas vantagens da idade, como a liberdade de ter ideias ou a “permissão” de poder agir por impulso.

Estas “pequenas unidades sociais” nada mais são do que outros adultos exercendo a função parental na relação com o jovem. Os modelos para se identificar seguem sendo importantes, seja pela questão da autoridade, seja servindo como parâmetro de conduta. São fundamentais as figuras que ocupem o lugar do representante da função materna (na continência e no acolhimento) e do representante da função paterna (portador da moralidade e das regras a serem seguidas, assim como as punições em caso de transgressão).

Em certas vivências da parentalidade, os familiares se veem obrigados a impor circunstâncias e mudanças radicais nas regras da casa ou no grau de liberdade do filho, de modo a ele não ter outra alternativa a não ser se comportar de determinado modo. Aprender a observar os efeitos das situações domésticas e externas em cada filho é importante para saber como agir. Entretanto, o ensino ativo e explícito mantém-se fundamental.

 

Pensando sobre limites

A meta da vida vai além de ser feliz, se divertir, consumir, não obedecer e querer negociar tudo. Se por um lado, alguns pais buscam terceirizar a educação dos filhos, por outro, o ambiente deixou de ser educativo, atribuindo a tarefa de educar exclusivamente aos pais. O papel da escola e da sociedade também deve ser repensado em meio a este processo.

Torna-se uma empreitada e tanto propor um único modelo de impor e administrar os limites, pois cada situação possui as suas peculiaridades e modos de lidar com as situações e conflitos. O diálogo e a aliança parental são fundamentais, pois criam parâmetros sólidos na educação e supervisão da entrada gradual do jovem na vida adulta. Independe de os pais morarem juntos ou  separados, quando eles conversam de modo cooperativo, tendo como foco os interesses e necessidades dos filhos, a convivência é tranquila e produtiva. Assim, eles poderão dedicar suas energias para explorar as próprias possibilidades vocacionais. Nossos filhos e a sociedade agradecem.

 

Leia a versão completa desse tema no
Fascículo de Psicologia 04
Adolescência: família, identidade e limites

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